A medida certa por Joel Neto in DN 2014-01-08
"Não vale a pena particularizar. Eusébio foi enorme, deve permanecer enorme na
nossa memória e a vozearia que se verificou em torno da sua morte dificulta essa
eternização. Contribuíram para ela os jornais e as rádios, contribuiu com
certeza para ela a internet (em especial as inefáveis redes sociais), mas
contribuiu em grande parte para ela a televisão também.
Cobrir a morte e o funeral do "Pantera Negra" era um trabalho difícil, que
exigia uma capacidade de improvisação enorme e um cuidado estilístico espontâneo
maior ainda. Mas os trabalhos difíceis não são isentos de escrutínio.
Há um nível ótimo de cobertura jornalística para cada evento. Esse nível
ótimo é sempre difícil de encontrar e é o jornalismo ele próprio. Neste caso,
como noutros, foi simplesmente pulverizado.
Portanto, nisto estou em radical desacordo com o meu colega Nuno Azinheira.
Ouvir os mesmos depoimentos centenas de vezes (é de centenas de vezes que
estamos a falar), assistir ad nauseam ao aproveitamento político que do
acontecimento fizeram representantes dos mais diversos partidos, acompanhar as
câmaras em olhares voyeuristas sobre a urna e os rostos em volta, ver cidadãos
de todas as origens reclamando-se coprotagonistas da história, porque um dia
encontraram Eusébio num café ou se fizeram fotografar ao seu lado no Estádio da
Luz ou o viram marcar um golo - nada disso foi nobilitante, nem para o
equilíbrio, a ponderação e o recato que se deve exigir à reportagem, nem
seguramente para a própria memória de Eusébio.
Era tentador, era previsível - e, aliás, vir agora dizê-lo também o era. Mas,
por outro lado, não pode deixar de ser dito, como tudo o que é importante."